(XXI)

Era tarde. Estávamos cansados. A dor no coração dela transbordava pelos olhos. Não era nada grave. Estava apenas triste, de TPM, de mau-humor. Frustrada porque não havia conseguido dar conta de tudo que havia planejado no dia. E mesmo assim, ela era puro amor. Sentia a sua dor no meu coração, que pulsava com doçura pela simples existência dela em minha vida.

 

Pedi licença para tomá-la em meus braços. Estendi a minha mão, sobre a qual ela posou a sua. Puxando-a suavemente pela mão, convidei-a a se levantar. Ela se ergueu, metade elegante, como sempre é, metade desabando, como às vezes fica.

 

Cabisbaixa, com a força de seu corpo cedendo ao sono, abraçou-me. Pousou sua face direita sobre meu ombro e afundou seu rosto em meu pescoço. Seus braços continuavam delicados, mesmo se apertavam meu peito com um misto de amor e angústia.

 

Esticando a mão, apertei um botão e a música começou a tocar. Enquanto as notas se desdobravam e alcançavam nossos ouvidos, algo no tempo parava. Pouco a pouco. Seu peso afundava mais e mais em meu peito, e seu abraço me dissolvia numa melancolia, gentil e silenciosa.

 

Num suspiro, chorou. E o que habita em mim se aqueceu. De gratidão, compaixão, beleza, alívio, inspiração, surpresa, força, encontro. Nos pequenos passos lentos que dávamos, para um lado e para o outro, éramos um vasto minúsculo eterno ninho de cura, e ela a sacerdotisa, que em sacrifício se doava para fazer a dor do amor se transformar no prazer do amor outra vez.